Exposição Frida Kahlo: impressões, fotos e feminismo

(Atualizado em 17/6/2020)

Quarta-feira, 1º de junho, 2016. Três dias antes eu decidia, de supetão, ir de Goiânia a Brasília num bate e volta entre as 5h30 e 21h. Tudo isso para ir à exposição “Frida Kahlo Conexões entre Mulheres Surrealistas no México”, prestes a se encerrar e que eu, que a esperava desde meados do ano anterior, deixei para a última hora.

Depois de algumas horas imersas, hora de tomar café inebriada de Frida Kahlo, na cafeteria ao lado do local da exposição

Vivi uma verdadeira imersão no contexto artístico de Frida Kahlo e suas colegas artistas. Fiquei menos de duas horas dentro da galeria e ao final do longo trajeto, minhas pernas doíam e meu íntimo dizia que a missão estava cumprida. Foram muitos minutos de sentimentos abstratos diante de pinturas com forte cunho surrealista, apesar de ser conhecido que Frida não se intitulava surrealista ou de qualquer outra corrente artística. “Pinto a mim mesma porque sou o assunto que conheço melhor”, registrou.

Com curadoria da pesquisadora Teresa Arcq, a mostra reúne obras de Frida Kahlo que eu não tinha visto em minhas inúmeras buscas pela internet, o que foi muito bacana do ponto de vista do ineditismo. Algumas que eu já conhecia bem pela web, mas, como esperado, estar ali, diante das originais, me emocionou. Teve obras que eu esperava ver e não estavam no acervo dessa exposição.

Junto com os trabalhos de mais 14 artistas, a exposição reuniu 136 obras entre pinturas e fotografias, dispostas em várias galerias de maneira a tentar traçar uma conexão de temáticas e estilos, além de, claro, evidenciar o elo entre as autoras das obras – como o próprio nome do evento sugere. Eu iria além nessa questão da conexão, pois, sendo mulher, também me liguei àquele imaginário de obras artísticas.

A impressão que essa disposição das pinturas me causou foi a de que se tentou ordenar o desordenado das vidas intensas dessas 15 mulheres autênticas, à frente do seu tempo, que pintavam por estarem dispostas a se expressar, amar livremente e que conseguiram, por meio da ARTE, se perpetuar no tempo, afinal, suas obras estão viajando mundo afora. Só no Brasil, já percorreram três Estados e o DF. Apesar do maior número de obras e fotografias de Frida Kahlo, percebi que houve a preocupação de usar o espaço democraticamente entre tantas artistas, misturando as obras entre si, sem um destaque propriamente dito.

A cada mudança de ambiente/galeria, um texto foi cuidadosamente escrito com o intuito de narrar/interpretar o que aquela remessa de obras pretendia remeter ao estarem juntas. Apesar de parecer muito didático para obras de arte que mexem com o inconsciente e que, no fundo, são de livre interpretação, é louvável a tentativa máxima de contribuir para que a experiência dos visitantes fosse a mais completa possível. Como nem todos tiveram oportunidade de ir às visitas guiadas (meu caso), foi algo que ajudou bastante. Havia muitos estudantes de ensino médio, então a iniciativa se mostrou bem válida se eles tiverem lido, é claro.

Por Frida Kahlo | A noiva que se espanta ao ver a vida aberta, 1943

Além das obras em si, algumas galerias me prenderam mais que outras, caso da parte dedicada às naturezas mortas (que pasmem, eu nem gosto), mas que essas artistas usavam para protestar e falar de tabus para a época, como o sexo e a independência feminina, por exemplo (Isso eu li nas placas informativas que citei); e também a etapa dedicada especificamente a obras surreais, que ressaltam a feminilidade e a magia. O simbolismo presente nas obras fez com que eu me sentisse em comunhão com o feminino: O corpo, o sexo e a maternidade. Assim como as angústias e lutas de ser mulher. De ser humana num corpo físico, que aprisiona.

A MÁGICA | Sylva Fein (1954)
Técnica: Tempera de ovo sobre madeira Masonite

Ao final, uma parte se dedicou a obras com teor nacionalista, mexicano, e quase réplicas das vestimentas que Frida Kahlo usava. Não eram peças que pertenceram

à artista, mas que certamente ela usaria. A intenção foi mostrar a produção artesanal mexicana, muito valorizada por Frida, que tinha um estilo próprio de se vestir. Confesso que me identifiquei com muitas roupas, saias cumpridas, lenços e acessórios floridos para cabelo. Num canto em separado uma sala foi separada para a exposição de registros em jornais e revistas, anotações das artistas, enfim, a curadoria buscou ao máximo transportar os visitantes ao universo dessas artistas.

Gosto não se discute, mas…

É preciso o mínimo de conhecimento para debater sobre alguns assuntos.  Só para apimentar um pouco, um breve relato: Hoje, vi o comentário de um desconhecido na internet que dizia que as pinturas de Frida Kahlo só refletiam a vida sem graça de uma mulher feia com a vida sofrida. O rapaz se dedicou a denegrir a imagem dela enquanto mulher que foge dos padrões de beleza usando até alguns casos íntimos, como o que ela teve com o filósofo marxista Trotsky.  Segundo ele, foi à mostra porque pensou que veria arte, mas se deparou com obras não artísticas, mas sim egocêntricas, já que ela pintava SÓ autorretratos. Arte, escreveu ele, seria somente o que foi feito no Renascimento, com excesso de perfeição e beleza. Essa manifestação reflete, tão somente, a ausência do ensino de Artes nas escolas e, lógico, noções de História e interpretação.

Frida é Arte. Não sou eu que digo, não tenho essa autoridade. É o mundo quem está mostrando isso. Um dos maiores enigmas da Arte Contemporânea é justamente esse: Será que tudo é Arte? Aparentemente, sim, pois arte é a expressão do ser. Não é só estética e objeto de decoração. Para quem quer usá-la assim, paciência e livre arbítrio…

Arte de verdade é para fazer sentir. E quem instituiu que somente sentimentos bonitos devem emergir ao se olhar uma obra? O ser humano é feito do feio e do belo, então produz esses dois lados de si. Frida soube como ninguém expressar essa Arte humana, trazendo para fora as mazelas carnais da dor e da vida. Fez a diferença num contexto em que só homens tinham reconhecimento como artistas. Valorizou a cultura mexicana no lugar de importar estilos de outros povos como tantos pseudo artistas fazem (até hoje). Técnica qualquer um é capaz de adquirir, com treino. Mas inspiração e criatividade, são outros 500…

A seguir, mais alguns registros fotográficos (todos permitidos pela curadoria da exposição)